Em 1972 quando foi posto no ar pela
primeira vez o programa Globo Repórter, se sonhava com um programa de notícias
e reportagens sérias que pudesse cativar interesse tanto do povão como dos mais
letrados. O que não se imaginava era o sucesso que seu tema principal, um
número encontrado apenas em uma trilha sonora de um filme B americano, faria.
Durante os primeiros anos do programa,
o tema era a versão original do instrumental "Freedom Of Expression,"
executado pelo desconhecido conjunto chamado The J. B. Pickers. Hoje, quase
trinta anos mais tarde, o programa Globo Repórter continua utilizando o mesmo
tema, apenas agora em uma versão caseira executada por um sintetizador, versão
no ar desde a década de oitenta.
Quem poderia adivinhar que um tema tão
pouco conhecido no seu país de origem, pudesse cativar quase toda uma nação que
imediatamente associa aquele baixo e guitarra pulsantes com as urgentes
reportagens a serem exploradas pelo programa? E de 1972 para cá se criou a
grande curiosidade em alguns de saber, que banda é essa? Chutavam alguns se
tratar de Pink Floyd, em algum trabalho raro
que nunca chegou a ser lançado em um de seus discos oficiais. Quando o filme
"The Vanishing Point" contendo a honrosa faixa "Freedom Of
Expression", teve sua trilha sonora lançada no Brasil, pôde-se conferir a
autoria aos anônimos The J. B. Pickers.
Continuava a duvida, quem são esses J.
B. Pickers? Não constam em catálogo algum de discos, tampouco nenhuma enciclopédia de rock
faz qualquer menção a essa banda. Passaram alguns a especular se J. B. não
seria Jeff Beck? Até mesmo hoje em dia, com a conveniência da internet, se
fizer uma busca sobre The J. B. Pickers, tudo que irá encontrar é a menção ao
filme Vanishing Point ou outros internautas, curiosamente perguntando também o
que se sabe a respeito desta banda. Afinal, quem são esses ilustres
desaparecidos? Pois bem, vamos então matar a charada agora para vocês.
The J. B. Pickers não existe. É um nome
fictício utilizado então exclusivamente na gravação de duas faixas deste filme,
The Vanishing Point. Seus músicos são contratados de estúdio e não há
disponível no momento a relação de seus nomes. Posso comentar apenas sobre a
autoria do tema, seu idealizador, J. B., ou seja, Jimmy Bowen.
Jim Bowen nasceu em Santa Rita, Novo México,
em 1937, mas foi criado em Dumas, no Texas, desde os oito anos de idade. Mal
sabia tocar seu baixo quando em 1957 sua banda de rockabilly, The Orchids,
chamou a atenção de Roy Orbison. Este por sua vez, facilitou o contato com
Norman Petty que organizou uma sessão de gravação em Clovis, Novo Mexico. Lá
gravaram duas faixas, "Party Doll" cantando o colega Buddy Knox e
"I'm Stickin with You" com ele, Jimmy Bowen. As duas canções ganham
co-autoria Knox-Bowen e o compacto, lançado pelo pequeno selo Triple
D, imprime em cada lado o crédito Buddy Knox & the Rhythm Orchids e Jimmy
Bowen & the Rhythm Orchids. Inesperadamente, o compacto se torna um sucesso
entre as rádios da região.
Jimmy Bowen |
Sempre alerta ao que estava acontecendo
na música pelo país, o famoso DJ Alan Freed acabou ouvindo e colocando o
compacto em sua programação. Uma vez em Nova York, The Rhythm Orchids tiveram a
oportunidade de participar de alguns dos Rock And Roll Shows promovidos
por Freed, o que atraiu o interesse de Morris Levy da gravadora Roulette
Records em contratá-los. Se tratando de um conjunto de rapazes jovens, caipiras
do interior, podem imaginar o choque cultural que não deve ter sido estar em
Nova York dividindo as atenções com gente como Little Richard, cuja homossexualidade chocou
a todos. Igualmente difícil imaginar os rapazes tentando tratar das negociações
de contratos com executivos de gravadoras da 'cidade grande'. Levy amarrou o
conjunto em um contrato desfavorável e obrigou-os a cumprí-lo. Ele dividiu a
banda em duas, e lançou simultaneamente compactos com Buddy Knox & the
Rhythm Orchids e Jimmy Bowen & the Rhythm Orchids.
Enquanto "I'm Stickin with You" de Jimmy Bowen & the
Rhythm Orchids só chegou a No.17, "Party Doll" de Buddy Knox &
the Rhythm Orchids chegou a No.1. De fato,
Buddy Knox era infinitamente melhor músico e cantor, e sua carreira dentro dos
três anos de contrato com a Roulette Records lhe rendeu outros hits entre as
vinte mais das paradas de sucesso. Jimmy Bowen pelo contrario, apesar de lançar
onze compactos até janeiro de 1960, o fim de seu contrato de artista com a
Roulette, jamais conseguiu colocar outra canção entre os vinte mais.
Contudo, Bowen se interessa cada vez
mais por produção de discos e embora ocasionalmente lançando seu próprio
material conforme exigia seu contrato, passou também a produzir para outros
artistas dentro da Roulette Records. Seu trabalho deve ter agradado, pois Frank
Sinatra o chama para trabalhar com ele na Reprise Records. Desta maneira, aos
vinte e cinco anos, a sua carreira como produtor deslancha. Bowen consegue
colocar Sinatra e seus amigos novamente nas paradas de sucesso durante a década
de sessenta. Agradar Frank Sinatra sempre confere um selo de qualidade para
qualquer currículo. Principalmente porque Sinatra nem sempre quer ouvir uma
opinião desfavorável, portanto ai de você se algo não der o resultado esperado.
Com competência, Jimmy Bowen produziu
uma sucessão de bons discos que venderam bem, de artistas como Sammy Davis Jr.,
Dean Martin, Nancy Sinatra e Bert Kaempfert. Depois da passagem pela Reprise,
trabalhou para a Capitol, MGM, Elektra/Asylum, e MCA.
Na década de setenta, foi responsável
pela supervisão de sua primeira trilha sonora, o filme "The Vanishing
Point." Na trilha, além de artistas consagrados como Mountain e Big Mama
Thorton, há três faixas compostas por Jimmy Bowen. Um tema incidental chamado
"Love Theme" que é creditado ao Jimmy Bowen Orchestra & Chorus, e
dois temas, o funkão "Super Soul Theme" e o rock pauleira,
"Freedom Of Expression" creditados ao The J.B. Pickers. Outras
participações em trilhas sonoras incluem os filmes "Smokey & the Bandit
2" de 1980, "Slugger's Wife" de 1985, e a trilha sonora da peça
teatral "Big River" em 1988.
Cena de "The Vanishing Point" |
Na década de oitenta em diante, Bowen
passou a trabalhar cada vez mais com música country, fixando-se em Nashville e
segundo alguns, contribuindo para baratear os custos de produção, utilizando
uma política austera de investir apenas em artistas que seguramente vendem.
Durante a segunda metade da década de setenta ele gravou artistas do quilate de
Glen Campbell e Kenny Rogers. Na década de oitenta, gravou Conway Twitty, Hank Williams Jr., George
Strait, Steve Wariner, Steve Earle, The Oak Ridge Boys, Kim Carnes, Reba
McEntire e Garth Brooks. Nos anos noventa, produziu discos de Andy Williams,
Chris Le Doux, The Pirates of Mississippi, e Willie Nelson entre outros.
Destes, Bowen se desentendeu com Garth
Brooks, que de jovem e submissa revelação, cresceu para se tornar um super
astro do country, e portanto ganhou autonomia para sustentar suas próprias
decisões. Jimmy Bowen acabou nutrindo um câncer e deixou a gravadora,
inicialmente pensando em se aposentar. Hoje, ele volta a tocar como músico em
sua banda de bluegrass, Jimmy Bowen & the Santa Fe, formados por Jimmy
Bowen no mandolin, Gary Reece no banjo, John Pennell no Baixo e Ron Lanena na
guitarra.
Confira abaixo a versão original da icônica abertura da série televisiva:
Fonte: Whiplash!
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